ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA
Alguns recuam a origem histórica do habeas corpus ao direito romano, na Idade Antiga, no qual havia uma ação chamada Interdicto de homine libero exhibendo destinada a fazer exibir, ou seja, soltar e mostrar, algum cidadão romano que estivesse aprisionado indevidamente. No entanto, a maioria da doutrina, mais atenta à realidade histórica, encontra na Magna Charta Libertatum (A Grande Carta das Liberdades) a origem remota do habeas data. Realmente, é assim: acha-se o fundamento histórico mais primário do habeas corpus no nº 39 da Magna Carta, assinada pelo Rei João Sem Terra em 1215, para assegurar liberdades antigas, imemoriais, de seus súditos.
O nº 39 da Magna Carta diz: Nenhum homem será preso ou detido em prisão ou privado de suas terras ou posto fora da lei ou banido ou de qualquer maneira molestado; e não procederemos contra ele, nem o faremos vir, a não ser por julgamento legítimo de seus pares e pela lei da terra.
Após, foram feitas a Petition of Right de 1628, tornando o habeas corpus uma garantia irrecusável a qualquer súdito inglês; o Habeas Corpus Act de 1679, que disciplinou o habeas corpus para os presos arbitrariamente sob a acusação de haver cometido um crime; e o Habeas Corpus Act de 1816, que estendeu o habeas corpus para qualquer tipo ou ocorrência de prisão ou detenção arbitrária, independentemente de haver suspeita ou acusação de crime; por exemplo, além de garantir a liberdade de locomoção para o indivíduo que continuasse preso sem ordem legal do juiz, também a garantiu para a criança detida fora da casa de seus pais, para a pessoa sã que tenha sido internada como louco ou doente em hospício, casa de saúde ou hospital, para a freira que estiver sendo impedida de deixar o convento, etc.
Da Inglaterra passou para a Constituição dos Estados Unidos da América.
No Brasil, não havia habeas corpus na Constituição Política do Império do Brasil, de 24 de março de 1824, tendo sido introduzido no plano infraconstitucional, pelo Código de Processo Criminal de 29 de novembro de 1832, cujo artigo 340 determinava: Todo cidadão que entender que ele ou outrem sofre uma prisão ou constrangimento ilegal em sua liberdade tem direito de pedir uma ordem de habeas corpus em seu favor.
No plano constitucional surgiu na primeira Constituição Republicana, de 24 de fevereiro de 1891. O artigo 72 fez a Declaração de Direitos nessa Constituição. O habeas corpus foi previsto no § 22 desse artigo, que teve inicialmente a seguinte redação: dar-se-á o habeas corpus, sempre que o indivíduo sofrer ou se achar em iminente perigo de sofrer violência ou coação por ilegalidade ou abuso de poder. A redação desse parágrafo deu ensejo à chamada doutrina ou teoria brasileira do habeas corpus.
A redação daquele parágrafo não falava em liberdade de locomoção. Com isso, o objeto do habeas corpus se tornou o mais amplo possível. Começou o habeas corpus a ser utilizado, primeiro timidamente, mas depois intensivamente, para proteger todo e qualquer direito ameaçado ou violentado por ilegalidade e abuso de poder.
Ficou famoso, entre muitos, o que ficou conhecido como “habeas corpus da forme”, impetrado na comarca de Macaé, no Estado do Rio de Janeiro, na primeira década do século XX. O governo estadual, com as finanças arruinadas, atrasou vários meses o pagamento do funcionalismo; e também não pagou os fornecedores de alimentação dos presos na cadeia.
Estes impetraram um habeas corpus e o juiz os mandou soltar. Assim muitos casos foram surgindo de habeas corpus contra omissões ou ações governamentais. Ademais, juristas, do porte de Rui Barbosa e Pedro Lessa, teorizavam que, nos termos da Constituição de 1891, o habeas corpus brasileiro defendia não apenas diretamente o direito de locomoção, mas todo e qualquer direito que de qualquer modo se relacionasse com o direito de locomoção e fosse ameaçado ou violentado por ilegalidade ou abuso de poder. Surgiu assim a chamada doutrina ou teoria brasileira do habeas corpus.
Abaixo estão os textos constitucionais do habeas corpus nas Constituições brasileiras:
Constituição de 1891 (art. 72, § 22): “Dar-se-á habeas corpus, sempre que o indivíduo sofrer ou se achar em iminente perigo de sofre violência ou coação, por ilegalidade ou abuso de poder.”
Constituição de 1981 (Revista em 1925 – art. 72, § 22): “Dar-se-á habeas corpus, sempre que alguém sofrer ou se achar em iminente perigo de sofre violência, por meio de prisão ou constrangimento ilegal em sua liberdade de locomoção.”
Constituição de 1934 (art. 113, 23): “Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade, por ilegalidade ou abuso de poder. Nas transgressões disciplinares não cabe o habeas corpus.”
Constituição de 1937 (art. 122, 16): “Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal, na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar.”
Constituição de 1946 (art. 141, § 23): “Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. Nas transgressões disciplinares, não cabe o habeas corpus.”
Constituição de 1967 (art. 153, § 20): “Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. Nas transgressões disciplinares, não caberá habeas corpus.”
CONSTITUIÇÃO FEDERAL 1988 E CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
Apesar das diferenças de redação, a Constituição Federal e o Código de Processo Penal, dão ao habeas corpus conotações conceituais plenamente compatíveis. Em ambos se lê que a finalidade do instituto é proteger um dos mais básicos dos direitos humanos: a liberdade de locomoção, dita também liberdade de ir e vir ou, como completam alguns perfeccionistas, liberdade de ir e vir ou ficar. Este é o direito humano fundamental, em latim, jus ambulandi et manendi, objeto do habeas corpus.
A liberdade de locomoção é tratada pela CF com as seguintes determinações:
LXI – ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;
LXII – a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada;
LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;
LXIV – o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial;
LXV – a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;
LXVI – ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;
LXVII – não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel;
O habeas corpus é positivado no inciso LXVIII do artigo 5º da CF e no artigo 647 do Código de Processo Penal:
Art. 5º (…)
LXVIII – conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;
(Constituição Federal)
Art. 647. Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar.
(Código de Processo Penal)
A CF diz que essa liberdade deve estar sofrendo ou na iminência de sofrer violência ou coação. O CPP diz o mesmo, mas acrescenta à coação o qualificativo ilegal e fala em coação ilegal. Como seria absurdo admitir habeas corpus contra coação legal (por exemplo, contra prisão legalmente decretada), efetivamente esse acréscimo serve apenas para preparar o artigo seguinte, no qual define os casos em que a coação é havida por ilegal no âmbito do processo penal, a saber:
Art. 648 – A coação considerar-se-á ilegal:
I – quando não houver justa causa;
II – quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei;
III – quando quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo;
IV – quando houver cessado o motivo que autorizou a coação;
V – quando não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em que a lei a autoriza;
VI – quando o processo for manifestamente nulo;
VII – quando extinta a punibilidade.
Ademais, o dispositivo da CF acrescenta que a violência ou a coação deve dar-se por ilegalidade ou abuso de poder. O que, portanto, resulta na mesma conceituação. Ademais a CF acresce que o constrangimento da locomoção pode resultar, além da ilegalidade, também de um abuso de poder qualquer, ainda que revestido de aparente legalidade.
Enfim, o dispositivo do CPP termina com uma exceção, salvo nos casos de punição disciplinar, com vistas a excluir do habeas corpus as punições de caráter disciplinar internas às corporações militares. Mas o preceito constitucional não encerra essa exceção porque, a despeito de ferir o método de legislar, que recomenda reunir as disposições referentes a uma só e mesma matéria, a CF deslocou essa exceção para um parágrafo do artigo 142, a saber:
Parágrafo 2º Não caberá habeas corpus em relação a punições disciplinares militares.
A Constituição anterior, Constituição de 25 de janeiro de 1967, com a redação dada pela Emenda Constitucional de 19 de outubro de 1969, mantinha juntas a regra e a exceção, assim redigidas, como um dos parágrafos do artigo 153:
Parágrafo 20 Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. Nas transgressões disciplinares não caberá habeas corpus.
Os dispositivos contidos no CPP devem harmonizar-se com o preceito constitucional, sob pena de serem rechaçados por inconstitucionalidade. Assim, não é de subsistir como constitucional o § 2º do artigo 650 do CPP, no qual se diz: Não cabe o habeas corpus contra a prisão administrativa, atual ou iminente, dos responsáveis por dinheiro ou valor pertencente à Fazenda Pública, alcançados ou omissos em fazer o seu recolhimento nos prazos legais, salvo se o pedido for acompanhado de prova de quitação ou de depósito do alcance verificado, ou se a prisão exceder o prazo legal.
PESSOAS ENVOLVIDAS
Um habeas corpus envolve diferentes pessoas:
Paciente é quem sofre ou está na iminência de sofrer violência ou coação ilegais em sua liberdade de locomoção. Óbvio, que somente pode ser uma pessoa física e independentemente de sua idade, nacionalidade, sexo, ou de qualquer outra condição.
Impetrante é quem requer o mandado de habeas corpus em favor de si mesmo ou de outrem. O impetrante pode ser qualquer pessoa física ou jurídica e mesmo os analfabetos, desde que o subscrevam por sua impressão digital ou por outra pessoa a rogo. No fundo, qualquer um pode ser impetrante de habeas corpus a favor de si mesmo ou de outrem como paciente. A pessoa física – é óbvio – só pode ser impetrante e não paciente. Mas o paciente pode ser impetrante em prol de si mesmo.
Impetrado é o particular ou a autoridade pública contra quem é pedida a ordem de habeas corpus: é o agente coator que, com ou sem violência, tolhe a liberdade ambulatória do paciente. Não se requer seja a pessoa coatora uma autoridade pública. Pode ser um particular. Por exemplo, o proprietário de uma fazenda, o superintendente de um hospital, o prior de um convento, o diretor de um internato de ensino, desde que mantenham detida alguma pessoa arbitrariamente, pode ser impetrados.
Detentor ou carcereiro é aquele que detém preso o paciente, podendo ser o coator ou outrem a mando ou serviço dele.
TIPOLOGIA E NATUREZA JURÍDICA
Dois são os tipos (ou espécies) de habeas corpus.
Diz-se liberatório ou repressivo ou corretivo o que tem por finalidade afastar constrangimento ilegal já realizado contra a liberdade de locomoção do paciente. Visa a corrigir o desvio, reprimir a violência, liberar o indivíduo da prisão ou detenção arbitrária. Daí, o nome dessa primeira espécie.
Já o segundo tipo de habeas corpus se diz preventivo porque visa a prevenir o mal antijurídico: evitar a perpetração ilegal e abusiva de uma coação ou violência contra a liberdade de locomoção do paciente. Para dar ensejo a este último tipo, é preciso haver um fundado receio de que o ato ilegal ou abusivo será cometido e, para evitá-lo, expede-se um mandado judicial de salvo-conduto. O habeas corpus preventivo foi introduzido no Brasil pelo § 1º do art. 18 da Lei nº 2.033, de 20 de setembro de 1871, que promoveu ampla reforma judiciária.
Exatamente porque o habeas corpus pode ser impetrado no grau superior de jurisdição (por exemplo, ante um Tribunal de Justiça) contra coação ou abuso ilegais cometidos no grau inferior (por exemplo, por um juiz singular) em decorrência e no curso de um processo penal, o CPP o incluiu como o capítulo X, intitulado Do habeas corpus e seu processo, no título II, intitulado Dos recursos em geral.
Igualmente, alguns sustentaram uma tal natureza recursal. No entanto, outros, como Rui Barbosa e Frederico Marques, sustentaram o caráter de ação independente. Mesmo Pinto Ferreira, ao admitir que no duplo grau de jurisdição pode o habeas corpus assumir o caráter de recurso, já que é evidente que pode servir contra decisões do juiz de primeira instância para revê-las pelos tribunais ou por superior instância, não deixou de reconhecer que a real natureza do habeas corpus é a de ação.
O que avaliza e tranquiliza a afirmação de que essa inserção do habeas corpus entre os recursos, ainda que albergada na lei processual penal, não passa de um erro técnico, que deve ser corrigido o mais breve possível.
COMPETÊNCIA
Normalmente, a competência para processar e julgar o habeas corpus segue as regras normais das leis processuais. A CF fixa os casos especiais em que o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm competência, originária ou recursal, para conhecer e conceder o habeas corpus. Em situação de emergência, qualquer juiz é competente para apreciar inicialmente o habeas-corpus, inclusive para conceder a liminar. Se não for ele o juiz naturalmente competente para apreciar aquele habeas corpus, ele o conhece, concedendo ou não a liminar, e declina a competência para o juiz competente.
Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
I – processar e julgar, originariamente:
a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal;
b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República;
c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente;
d) o habeas corpus, sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores; o mandado de segurança e o habeas data contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal;
i) o habeas corpus, quando o coator for Tribunal Superior ou quando o coator ou o paciente for autoridade ou funcionário cujos atos estejam sujeitos diretamente à jurisdição do Supremo Tribunal Federal, ou se trate de crime sujeito à mesma jurisdição em uma única instância; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 22, de 1999)
II – julgar, em recurso ordinário: (ROC)
a) o habeas corpus, o mandado de segurança, o habeas data e o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão;
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
I – processar e julgar, originariamente:
a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais;
(…)
c) os habeas corpus, quando o coator ou paciente for qualquer das pessoas mencionadas na alínea “a”, ou quando o coator for tribunal sujeito à sua jurisdição, Ministro de Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;
II – julgar, em recurso ordinário: (ROC)
a) os habeas corpus decididos em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão for denegatória;
Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais:
I – processar e julgar, originariamente:
d) os habeas corpus, quando a autoridade coatora for juiz federal;
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
VII – os habeas corpus, em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição;
Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:
IV os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;
INSTRUMENTO
O processo do habeas corpus, como defende a mais fundamental das liberdades, é extremamente enérgico, rápido e simples. Não é sequer necessária a presença de advogado, podendo a pessoa impetrá-lo de per si mesma, sem estar representada por advogado, nem sequer assistida por alguém. Outrossim, o instrumento de impetração pode ser, além de uma petição normalmente formulada e protocolada, qualquer outro eficaz para atingir o fim de liberar quem esteja arbitrariamente detido: carta, telegrama, fax, e-mail, sem maiores formalidades. O que se exige é que o instrumento seja apto a noticiar, com veracidade, os elementos e as condições que justificam a concessão da ordem de habeas corpus.
Na prática não se expede ordem de apresentação e nem se interroga o paciente. O juiz apenas requisita informações da autoridade apontada como coatora, embora tal providência só seja prevista expressamente quando se trata de impetração perante o tribunal. É inadmissível a dispensa de informações da autoridade, pois poderá ser alegado falta de justa causa. Somente em casos excepcionais, em que a ilegalidade do constrangimento é demonstrada sem a menor dúvida é que se pode dispensar as informações para a concessão da ordem de habeas corpus. Impetrado o habeas corpus no 1º grau de jurisdição, o Ministério Público não intervirá antes de proferida a decisão. No Tribunal, o Ministério Público tem vista por dois dias, após a informação prestada pela autoridade coatora.
Logo abaixo, estão as regras procedimentais do CPP em relação ao habeas corpus:
Art. 612. Os recursos de habeas corpus, designado o relator, serão julgados na primeira sessão.
Art. 649. O juiz ou o tribunal, dentro dos limites da sua jurisdição, fará passar imediatamente a ordem impetrada, nos casos em que tenha cabimento, seja qual for a autoridade coatora.
Art. 650. (…)
Parágrafo 1º A competência do juiz cessará sempre que a violência ou coação provier de autoridade judiciária de igual ou superior jurisdição.
Art. 653. Ordenada a soltura do paciente em virtude de habeas corpus, será condenada nas custas a autoridade que, por má-fé ou evidente abuso de poder, tiver determinado a coação.
Parágrafo único. Neste caso, será remetida ao Ministério Público cópia das peças necessárias para ser promovida a responsabilidade da autoridade.
Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público.
Parágrafo 1º A petição de habeas corpus conterá:
a) o nome da pessoa que sofre ou está ameaçada de sofrer violência ou coação e o de quem exercer a violência, coação ou ameaça;
b) a declaração da espécie de constrangimento ou, em caso de simples ameaça de coação, as razões em que funda o seu temor;
c) a assinatura do impetrante, ou de alguém a seu rogo, quando não souber ou não puder escrever, e a designação das respectivas residências.
Parágrafo 2º Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.
Art. 655. O carcereiro ou o diretor da prisão, o escrivão, o oficial de justiça ou a autoridade judiciária ou policial que embaraçar ou procrastinar a expedição de ordem de habeas corpus, as informações sobre a causa da prisão, a condução e apresentação do paciente, ou a sua soltura, será multado na quantia de duzentos mil-réis a um conto de réis, sem prejuízo das penas em que incorrer. As multas serão impostas pelo juiz do tribunal que julgar o habeas corpus, salvo quando se tratar de autoridade judiciária, caso em que caberá ao Supremo Tribunal Federal ou ao Tribunal de Apelação impor as multas.
Art. 656. Recebida a petição de habeas corpus, o juiz, se julgar necessário, e estiver preso o paciente, mandará que este Ihe seja imediatamente apresentado em dia e hora que designar.
Parágrafo único. Em caso de desobediência, será expedido mandado de prisão contra o detentor, que será processado na forma da lei, e o juiz providenciará para que o paciente seja tirado da prisão e apresentado em juízo.
Art. 657. Se o paciente estiver preso, nenhum motivo escusará a sua apresentação, salvo:
I – grave enfermidade do paciente;
Il – não estar ele sob a guarda da pessoa a quem se atribui a detenção;
III – se o comparecimento não tiver sido determinado pelo juiz ou pelo tribunal.
Parágrafo único. O juiz poderá ir ao local em que o paciente se encontrar, se este não puder ser apresentado por motivo de doença.
Art. 660. Efetuadas as diligências, e interrogado o paciente, o juiz decidirá, fundamentadamente, dentro de 24 (vinte e quatro) horas.
1º Se a decisão for favorável ao paciente, será logo posto em liberdade, salvo se por outro motivo dever ser mantido na prisão.
2º Se os documentos que instruírem a petição evidenciarem a ilegalidade da coação, o juiz ou o tribunal ordenará que cesse imediatamente o constrangimento.
3º Se a ilegalidade decorrer do fato de não ter sido o paciente admitido a prestar fiança, o juiz arbitrará o valor desta, que poderá ser prestada perante ele, remetendo, neste caso, à autoridade os respectivos autos, para serem anexados aos do inquérito policial ou aos do processo judicial.
4º Se a ordem de habeas corpus for concedida para evitar ameaça de violência ou coação ilegal, dar-se-á ao paciente salvo-conduto assinado pelo juiz.
5º Será incontinenti enviada cópia da decisão à autoridade que tiver ordenado a prisão ou tiver o paciente à sua disposição, a fim de juntar-se aos autos do processo.
6º Quando o paciente estiver preso em lugar que não seja o da sede do juízo ou do tribunal que conceder a ordem, o alvará de soltura será expedido pelo telégrafo, se houver, observadas as formalidades estabelecidas no art. 289, parágrafo único, in fine, ou por via postal.
Art. 662. Se a petição contiver os requisitos do art. 654, § 1º, o presidente, se necessário, requisitará da autoridade indicada como coatora informações por escrito. Faltando, porém, qualquer daqueles requisitos, o presidente mandará preenchê-lo, logo que Ihe for apresentada a petição.
Art. 663. As diligências do artigo anterior não serão ordenadas, se o presidente entender que o habeas corpus deva ser indeferido in limine. Nesse caso, levará a petição ao tribunal, câmara ou turma, para que delibere a respeito.
Art. 664. Recebidas as informações, ou dispensadas, o habeas corpus será julgado na primeira sessão, podendo, entretanto, adiar-se o julgamento para a sessão seguinte.
Parágrafo único. A decisão será tomada por maioria de votos. Havendo empate, se o presidente não tiver tomado parte na votação, proferirá voto de desempate; no caso contrário, prevalecerá a decisão mais favorável ao paciente.
Art. 665. O secretário do tribunal lavrará a ordem que, assinada pelo presidente do tribunal, câmara ou turma, será dirigida, por ofício ou telegrama, ao detentor, ao carcereiro ou autoridade que exercer ou ameaçar exercer o constrangimento.
Parágrafo único. A ordem transmitida por telegrama obedecerá ao disposto no art. 289, parágrafo único, in fine.
LIMINAR
O pedido de liminar em sede de habeas corpus é construção jurisprudencial e a primeira concessão ocorreu em 31 de agosto de 1964, no habeas corpus nº 41.296, em favor do Governador de Goiás, Mauro Borges, pelo relator Gonçalves de Oliveira (STF), aduzindo: “Se no mandado de segurança pode o Relator conceder a liminar até em casos de interesses patrimoniais, não se compreenderia que, em casos em que está em jogo a liberdade individual ou as liberdades públicas, a liminar, no habeas corpus preventivo, não pudesse ser concedida.”
Em todo o caso de habeas corpus é possível o requerimento e a concessão de liminar. Como sempre, aqui também para a concessão da liminar são necessárias duas condições:
a) periculum in mora (= perigo na demora), ou seja, haver uma premência tal que, no final do processo, mesmo se concedido o mandado, o mal já tenha sido cometido de modo irreparável;
b) fumus boni juris (= fumaça de bom direito), quer dizer, haver comprovação pelo impetrante de que o socorrem documentos e provas que evidenciam, à primeira vista, que ele é titular do direito que está sendo ameaçado ou violado.
CUSTAS
A ação de habeas corpus não sujeita o seu autor a custas; é uma ação gratuita, conforme prescreve o inciso LXXVII do artigo 5o da CF, que estatui serem gratuitas as ações de habeas corpus e habeas data e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania.
LXXVII – são gratuitas as ações de habeas corpus e habeas data, e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania.