O que é ciência política?
Talvez seja melhor primeiro informar o que é ciência e o que é política:
Ciência é a forma de compreensão da realidade a partir da identificação de um objeto de estudo diante de um método de pesquisa. A compreensão da realidade sempre foi, desde a Grécia Antiga, dividida entre sujeito que conhece e objeto que é conhecido. Tanto que algumas considerações não são levadas a sério porque são entendidas como subjetiva (isto é, relativas apenas ao sujeito ou à vontade do sujeito). As considerações válidas, em ciência, são as objetivas, isto é, aquelas que podem ser verificadas por qualquer pessoa, independentemente de quem seja, pois a declaração se refere à natureza do objeto de estudo, sem interferência da posição pessoal do cientista.
Política é a forma pela qual as pessoas se organizam no espaço público em sociedade. Todas as discussões sobre como devemos nos conduzir em sociedade têm caráter predominantemente (senão essencialmente) político.
Ciência política, assim, é a teoria pela qual o objeto “política” é estudado da forma mais objetiva possível. Claro que, dependendo do método adotado pelo cientista, o resultado de sua verificação pode ser diferente do resultado que outro cientista, adotando outro método, encontrará.
O que é teoria geral do Estado?
Entendemos teoria como termo sinônimo de ciência.
Teoria geral (e não especial) porque temos por objeto, compreender o que é Estado nas mais diferentes formas, segundo os mais diferentes métodos, e buscar a compreensão mais ampla possível, por meio da comparação das várias formas de abordagem.
Teoria geral do estado é a ciência pela qual se compreende as estruturas e as causas de formação e desenvolvimento do Estado. Ou seja, tentaremos responder às seguintes perguntas:
- O que é Estado?
- Qual é seu conceito?
- Quais são seus elementos fundamentais?
- Como ele surgiu?
- Como ele se mantém?
- Como ele se organiza?
- Ele pode acabar um dia?
- Todos os Estados são iguais?
- O que eles têm em comum?
- Por qual motivo essa disciplina é ensinada no curso de Direito? O que tem a ver uma coisa com a outra?
Direito, na melhor expressão de Hans Kelsen, é esquema de interpretação da conduta humana. Isto quer dizer que as pessoas vivem em grupos e que, para ser possível a convivência, uma série de regras acaba por se estabelecer, do contrário a convivência seria impossível. Em grupos sociais complexos, as normas familiares ou tribais acabam sendo insuficientes para determinar a forma adequada de convivência social.
Se dentro das famílias ou das tribos havia certas regras imemoriais seguidas pelos seus integrantes, como é possível permitir a convivência pacífica entre pessoas que pertencem a famílias ou tribos diferentes?
Será possível que dois povos com culturas, valores, deuses, princípios e, portanto, regras de convivência próprias, possam conviver num mesmo espaço? Sabemos que é possível por comprovação empírica. Qual é ou quais são as regras adotadas pelos dois grupos para resolver seus conflitos? Atualmente, não temos dúvida, são regras (ou normas) jurídicas.
O direito é o arcabouço normativo pelo qual a conduta de qualquer pessoa, independentemente de sua família, tribo, grupo étnico ou social, será analisada. O direito é a forma de organização comum de todas as pessoas que convivem num mesmo território.
Mas há pessoas que não seguirão as regras. Se muitas pessoas deixarem de seguir as regras, elas perdem sua eficácia. De que vale termos normas se ninguém as cumpre? Quem poderá exigir o cumprimento das normas? Numa família, costumam ser os pais. Numa tribo, o chefe (cacique), o pajé (xamã), o guerreiro mais forte ou o conselho dos anciãos. Mas as normas jurídicas não podem ser garantidas nem por um cacique nem pelos pais de família. Quem tem a função de cumprir e fazer cumprir as normas jurídicas são as autoridades estatais: juízes, legisladores, delegados de polícia, policiais, oficiais de justiça, carcereiros etc.
Daí se nota que, sem o Estado, não é possível falar em direito. Não há direito sem Estado e vice-versa. O Estado é a organização pela qual os homens, modernamente, se relacionam em sociedade. Toda a estrutura denominada Estado serve para estabelecer a forma pela qual as pessoas irão se conduzir. A forma pela qual as pessoas devem se conduzir se chama direito. Essa forma é criada pelos legisladores, que são as autoridades estatais competentes para produzir as normas jurídicas (que fazem parte do direito).
Portanto, está muito claro que o direito nasce da política. Assim, se estudamos ciência política, também estamos estudando as causas e as razões de formação do direito. Ao mesmo tempo, é o direito criado pela política que dá legitimidade e legalidade para o Estado (e todas as autoridades competentes do qual elas fazem parte). Note-se que há uma inter-relação muito forte entre eles: direito e política são indissociáveis entre si. Um existe para dar força para a outra. Sem Estado, as normas jurídicas não são criadas nem exigidas. Sem direito, não há como organizar o Estado de forma legítima.
Ao se conhecer o Estado, por meio da Teoria Geral do Estado, é possível iniciar a compreensão de várias disciplinas do curso de direito, especialmente Direito Constitucional, Teoria dos Direitos Fundamentais, Direito Administrativo e Direito Tributário. Mas se o Estado é a estrutura que confere autoridade ao cumprimento das normas jurídicas, também podemos entender o Direito Processual e o Direito Penal. Se o Estado está sempre presente para proteger as relações sociais entre particulares, também é possível entender Direito Civil, Direito Empresarial e Direito do Trabalho.
Mas um Estado é apenas um conceito ideal?
Estado também é um conceito. Mas ele está indissociavelmente ligado às estruturas e à organização social de um povo em determinado tempo e lugar. As condições materiais sempre determinam as formas pelas quais as pessoas se relacionam. Isto é óbvio, pois os seres humanos não são (pelo menos ainda não) anjos que vivem de luz, mas pessoas feitas de carne e osso e que precisam se alimentar para sobreviver.
A única forma de existir neste plano de existência é por meio da transformação da natureza em alimento, bebida, roupas para se proteger do frio, abrigo para se proteger (na pré-história, de animais selvagens, durante a história, de tribos inimigas que pilhavam as terras e as provisões umas das outras). O homem não se distingue dos outros animais pela sua capacidade de transformar a natureza por meio do trabalho. Trabalho é o nome que se dá à forma mais básica de transformar a natureza (o mundo natural) em alimento, bebida e abrigo. Isso as abelhas, as formigas e outros animais gregários também fazem. A diferença está no fato de que o homem é o único que se transforma por meio do trabalho.
Veja-se a evolução da humanidade ao longo dos séculos. Toda forma de produzir desenvolve uma técnica que, em seguida, é aprimorada. De aprimoramento técnico em aprimoramento técnico, o ser humano deixou a caverna para fazer casas, deixou a coleta e a caça para desenvolver agricultura e pecuária, deixou as ferramentas de lascas e de pedras para construir ferramentas avançadas, como robôs, sistemas industriais.
Na medida em que o homem evolui, ele se torna mais consciente de sua condição humana e se humaniza cada vez mais. Se, no passado, havia guerras porque havia pouca comida (não é possível, com pouca tecnologia, obter alimento, bebida e abrigo para todos os seres humanos que habitam a mesma região. Haverá luta e extermínio), no presente pode haver guerras por manutenção de posições geopolíticas (por exemplo, a guerra do Iraque, cujo principal objetivo dos Estados Unidos foi garantir o suprimento de petróleo iraquiano e não procurar o Osama Bin Laden por lá).
Dependendo do estágio de evolução das forças produtivas (isto é, do momento histórico em que existem certas capacidades de transformação da natureza), os homens se organizam em sociedade conforme as possibilidades de produção (pois, sem produção, não há produtos, e sem produtos, não há o que comer ou beber nem há onde dormir).
A produção se dá por meio das formas que as pessoas se organizam para realizar essa produção. Ocorre a divisão social do trabalho. Uns vão caçar, outros vão costurar as redes de pesca ou as roupas, outros vão preparar o fogo, outros vão realizar cultos religiosos, outros vão proteger os limites da tribo ou cidade. Ou, conforme as capacidades produtivas, uns vão cuidar da plantação, outros do rebanho, outros do silo, outros do cortume. Ou ainda, uns vão cuidar das fábricas, outros da lavoura, outros dos serviços públicos etc. Na medida em que as forças produtivas dão um salto de qualidade em relação às forças anteriores, as relações sociais que organizam a produção devem ser alteradas para adequar à nova realidade.
Por exemplo. Na idade média não existia produção industrial porque ainda não havia sido inventada a máquina a vapor. Com esta invenção, os teares manuais deram lugar às máquinas têxteis. As relações sociais que organizam os produtores de tecido na idade média não serviram para organizar a produção de tecido em escala industrial. Mas este é um exemplo isolado.
A evolução tecnológica (a revolução industrial) causou muitas outras mudanças na vida normal dos feudos medievais. Tantas que as formas pelas quais a vida era organizada não suportou tanta novidade. A idade média acabou justamente porque a Era moderna tinha novas forças produtivas, que precisava, para se desenvolver, de novas relações sociais de produção.
A relação entre evolução das capacidades produtivas e relações sociais de produção explica porque na Grécia ou Roma Antiga as pessoas se organizavam de um modo, na Idade Média, de outro, e na Era Moderna, de outro, totalmente diferente. As relações sociais e as organizações podem até ter o mesmo nome (direito romano, direito medieval e direito positivo; cidade-Estado, (feudo,) Estado moderno), mas indicam estruturas sociais muito diferentes, tanto em termos qualitativos como quantitativos. Por exemplo, não é porque havia família em Roma Antiga que aquela família era a mesma família que hoje o Código Civil brasileiro prescreve.
Trocando em miúdos. Claro que é possível conceituar cada organização social de modo abstrato, apenas identificando a existência de certos elementos, em especial três: um território, um povo que habite esse território, e o poder de utilizar a força física monopolizado na instituição de um governo comum (para guardar e não esquecer: TPP => Território, Povo, Poder). Mas sempre é preciso levar em conta como é que certo povo foi habitar um certo território e quais foram as causas históricas que levaram esse povo a se submeter (ou a decidir) a um único poder político.